The Economist: rica e poderosa, a geração Z está assumindo o controle
Eles convivem com uma taxa de desemprego menor e remuneração é maior; além disso, não temem sair de um emprego em busca de algo melhor
Portal The Economist
Tradução por Augusto Calil – Portal Estadão
21/04/24
A Geração Z está tomando conta de tudo. Na parte rica do mundo, ela representa pelo menos 250 milhões de pessoas nascidas entre 1997 e 2012. Cerca de metade está atualmente empregada. No ambiente de trabalho americano médio, o número de pessoas da Geração Z (às vezes chamados de “Zoomers”) trabalhando em período integral está quase ultrapassando o número de baby boomers (os nascidos entre 1945 e 1964, cuja carreira está chegando ao fim) empregados em período integral. Os Estados Unidos têm atualmente mais de 6 mil Zoomers como diretores executivos e mil Zoomers na política. Conforme esta geração se torna mais influente, as empresas, os governos e os investidores precisam entendê-la.
Os estudiosos produzem muito material a respeito deste recorte da população. “Pesquisas” recentes da fabricante de salgadinhos Frito-Lay revelam que os Zoomers tem uma forte preferência por “salgadinhos que sujam os dedos”, como farelo de queijo. Mas gerações diferentes também demonstram diferenças mais profundas, em parte moldadas pelo contexto econômico em meio ao qual cresceram. Os alemães que chegaram à idade adulta nos anos 1920, de elevada inflação, aprenderam a detestar altas nos preços. Os americanos que viveram durante a Depressão tendiam a evitar investimentos na bolsa de valores.
Muitos argumentam que a Geração Z é definida pela sua ansiedade. O excesso de preocupação afeta também o psicólogo social Jonathan Haidt, da Universidade de Nova York, cujo novo livro, “The Anxious Generation” (A Geração Ansiosa), está causando impacto. Sob certos aspectos, os Zoomers são incomuns. Os jovens de hoje são menos propensos a formar relacionamentos do que os anteriores.
São mais propensos a ter depressão ou a dizer que não se identificam com o sexo de nascimento. São menos propensos a beber, fazer sexo, envolver-se em relacionamento, ou fazer qualquer coisa entusiasmante. Os americanos com idade entre os 15 e os 24 anos passam apenas 38 minutos por dia socializando, tempo que chegava a quase uma hora na década de 2000, de acordo com dados oficiais. Haidt considera isso um efeito dos smartphones, e das redes sociais que eles possibilitam.
Jovens de hoje são menos propensos a formar relacionamentos, fazer sexo e beber comparando aos de gerações anteriores Foto: Mirko Vitali/AXXEL6_+_VIEW-APART
O livro dele provocou uma intensa reação. No dia 10 de abril, a governadora do Arkansas, Sarah Huckabee Sanders, ecoou os argumentos de Haidt ao apresentar planos para a regulação do uso de smartphones e redes sociais por crianças. O governo britânico considera aprovar medidas semelhantes. Mas nem todos concordam com a tese de Haidt. E o cabo de guerra envolvendo a ansiedade da Geração Z eclipsou outra distinção deste recorte populacional. Em termos financeiros, a Geração Z está se saindo extremamente bem. Isso, por sua vez, está alterando sua relação com o trabalho.
Pensemos no grupo que precedeu a Geração Z: os Millennials, nascidos entre 1981 e 1996. Muitos entraram para a força de trabalho em um momento em que o mundo sofria com os efeitos da crise financeira de 2007-09, durante a qual os jovens sofreram desproporcionalmente. Em 2012-14 mais da metade dos jovens espanhóis que procuravam emprego não conseguiam trabalho. A taxa de desemprego entre os jovens na Grécia era ainda mais alta. A popular canção “Work Bitch”, de Britney Spears, lançada em 2013, trazia uma mensagem sem massagem para os jovens millennials: quem quiser algo de bom vai ter que ralar.
Os Zoomers que terminaram os estudos enfrentam circunstâncias muito diferentes. O desemprego entre os jovens na parte mais rica do mundo, atualmente na casa dos 13%, é o mais baixo desde 1991. A taxa de desemprego entre os jovens na Grécia é menos da metade da observada no seu auge. Nos hotéis de Kalamata, um destino turístico, há queixas por causa da falta de mão de obra disponível, algo impensável poucos anos atrás. As canções populares refletem o espírito dos tempos. Em 2022, a protagonista de uma música de Beyoncé se gabava, “Acabei de largar o emprego”. Olivia Rodrigo, cantora de 21 anos, popular entre os Zoomers americanos, se queixa de um ex cuja “carreira está decolando”.
Muitos optaram por estudar assuntos que os ajudam a encontrar emprego. No Reino Unido e nos EUA, os Zoomers estão evitando a área de humanas, buscando em vez disso assuntos de utilidade mais óbvia como economia e engenharia. Os testes vocacionais também se tornam cada vez mais populares. Com isso, os jovens podem se beneficiar de um mercado de trabalho de oferta de mão de obra restrita. Como a protagonista de Beyoncé, eles podem largar o emprego e encontrar outro se quiserem mais dinheiro.
Nos EUA, o aumento na remuneração por hora entre empregados de 16 a 24 anos chegou recentemente a 13% ao ano, em comparação com 6% para os trabalhadores com idade entre 25 e 54 anos. É o mais alto “prêmio pela juventude” observado desde o início da série histórica de dados confiáveis. No Reino Unido, onde a remuneração dos jovens é medida de outra forma, a remuneração média por hora para pessoas entre 18 e 21 anos aumentou incríveis 15% no ano passado, ultrapassando os aumentos no pagamento de outras faixas etárias por uma margem incomum. Na Nova Zelândia, a remuneração média por hora para pessoas entre 20 e 24 anos aumentou 10%, em comparação com uma média de 6%.
O ganho salarial sólido aumenta a renda familiar. Um novo estudo de Kevin Corinth, do American Enterprise Institute, e de Jeff Larrimore, do Federal Reserve, analisa a renda dos lares americanos de acordo com a geração, descontado o pagamento de impostos, as transferências do governo e a inflação. Os Millennials tiveram uma situação um pouco melhor do que a Geração X, formada pelos nascidos entre 1965 e 1980, quando tinham a mesma idade. Mas os Zoomers estão em situação muito mais confortável do que os Millennials quando estavam nessa idade. Um típico Zoomer de 25 anos tem uma renda anual do lar superior a US$ 40 mil, mais de 50% acima do que os baby boomers tiveram na mesma idade.
O poderio econômico da Geração Z era fácil de observar em uma apresentação recente de Olivia Rodrigo em Nova York. O público, formado principalmente por moças adolescentes e jovens de 20 e poucos anos, tinha pagado centenas de dólares por cada ingresso. As filas nas bancas de produtos licenciados, oferecendo camisetas por US$ 50, se estendiam por toda a arena de shows.
Olivia não encontrará dificuldade para vender seus produtos licenciados em outras partes do mundo conforme sua turnê atravessa o Atlântico. Isso ocorre em parte porque os Zoomers que entraram no mercado de trabalho estão ganhando bastante em todo o mundo desenvolvido. Em 2007 a renda média dos franceses com idade entre 16 e 24 anos correspondia a 87% da média geral. Agora, corresponde a 92%. Em alguns lugares, como Croácia e Eslovênia, os Zoomers ganham agora o mesmo que a média salarial.
Alguns Zoomers protestam, dizendo que a renda mais alta é uma miragem, pois não leva em conta a explosão no custo do ensino superior e da moradia. Afinal, o preço global dos imóveis está perto do recorde, e os formandos estão mais endividados do que antes. Mas, na realidade, os Zoomers estão enfrentando bem esses desafios porque ganham bastante. Em 2022 ,os americanos com menos de 25 anos gastaram 43% de sua renda já tributada em moradia e ensino, incluindo o pagamento de juros sobre as mensalidades universitárias, pouco abaixo da média para a população com menos de 25 anos de 1989 a 2019. Impulsionados por rendas mais altas, a proporção dos Zoomers americanos que têm casa própria é superior à dos Millennials quando tinham a mesma idade (embora seja mais baixa do que nas gerações anteriores).
O que significa essa riqueza? Pode parecer que os Millennials cresceram pensando que ter um emprego era um privilégio, e agiram de acordo. Eles cedem aos superiores e procuram agradar. Os Zoomers, em comparação, cresceram acreditando que ter um emprego é quase um direito seu, o que significa que sua atitude em relação ao trabalho é diferente. No ano passado os Zoomers se gabavam da chamada “desistência discreta”, investindo no trabalho apenas o esforço suficiente para evitar a demissão.
Outros falam na “segunda-feira minimalista”. O arquétipo da “girlboss” ou “poderosa”, que busca capturar o controle corporativo das mãos de homens controladores, interessa às Millennials. As mulheres da Geração Z são mais propensas a debater a ideia de serem “lesmas”, levando as coisas com calma e dando prioridade ao autocuidado.
Os dados concordam com os memes. Em 2022, os americanos com idade entre 15 e 24 passaram 25% menos tempo “no trabalho e em atividades ligadas a ele” do que em 2007. Um novo estudo publicado pelo FMI analisa o número de horas que as pessoas dizem considerar desejável para uma jornada de trabalho.
Não faz muito tempo, os jovens queriam trabalhar muito mais do que os mais velhos. De acordo com uma análise de Jean Twenge, da Universidade San Diego State, a parcela de americanos no último ano do ensino médio (17 ou 18 anos) para quem o trabalho é visto como “parte central da vida” teve uma queda acentuada.
Outra consequência é que os Zoomers são menos propensos ao empreendedorismo. Estimamos que apenas 1,1% das pessoas na casa dos 20 e poucos anos na União Europeia administre um negócio que empregue outra pessoa, e nos anos mais recentes essa proporção encolheu. No fim da década de 2000 mais de 1% dos bilionários do mundo eram Millenials, de acordo com a revista Forbes.
Na época, os estudiosos ficaram obcecados com fundadores muito jovens de empresas de tecnologia, como Mark Zuckerberg (Facebook), Patrick Collison (Stripe) e Evan Spiegel (Snapchat). Hoje, em comparação, menos de 0,5% da lista da Forbes são Zoomers. Quem sabe o nome de um famoso fundador de uma startup que seja da Geração Z?
Os Zoomers também estão produzindo menos inovações. De acordo com Russell Funk, da Universidade de Minnesota, os jovens de hoje são menos propensos a solicitar o registro de patentes do que no passado. Ou pensemos na parada de sucessos Billboard Hot 100, que mede as canções mais populares nos EUA.
Em 2008, 42% dos sucessos eram interpretados por Millennials; 15 anos mais tarde, apenas 29% eram interpretados por Zoomers. Taylor Swift, a cantora e compositora mais famosa do mundo, batizou seu álbum mais famoso de “1989″, pensando no ano em que nasceu. O mundo segue aguardando que alguém produza um álbum intitulado “2004″.
Por quanto tempo a vantagem econômica da Geração Z vai durar? Uma recessão afetaria os jovens mais do que o restante, como sempre ocorre com as recessões. A inteligência artificial pode desestabilizar a economia global, mesmo se os jovens acabarem ficando melhor colocados para enfrentar essas perturbações.
Mas, por enquanto, os Zoomers têm muito o que celebrar. Entre as canções apresentadas no Madison Square Garden, Olivia Rodrigo se senta ao piano e aconselha os fãs a agradecerem pelo que têm. “Crescer é bom pra cacete”, diz ela. “Temos todo o tempo do mundo para fazer o que queremos.” O tempo e o dinheiro.
Leia também: Geração Z é a menos flexível no trabalho, diz pesquisa