Feedback sincero começa dentro da equipe, diz especialista

Feedback sincero começa dentro da equipe, diz especialista

Peter Cauwelier pesquisa o aprendizado em times há mais de 15 anos e dá o passo a passo para construir um ambiente seguro para aprender com os erros

Por Stela Campos — Jornal Valor Econômico

18/09/2023

Peter Cauwelier: “O verdadeiro valor de uma equipe é o que acontece entre os seus membros” — Foto: Divulgação

Falar dos pequenos erros que acontecem diariamente em uma reunião de equipe para que todos saibam o que aconteceu e quem foi responsável é uma forma de preparar o grupo para lidar com erros de maiores proporções no futuro. Dar feedback positivo onde todos possam opinar sobre a contribuição de alguém pode abrir caminho para um feedback negativo e mais transparente. O líder pedir ajuda à equipe para fazer o que não sabe dá exemplo, e ajuda a disseminar o hábito da colaboração.

Essas são recomendações de Peter Cauwelier para criar um ambiente de segurança psicológica nas equipes. Há mais de 15 anos ele estuda o aprendizado em times. Sua tese de doutorado partiu dos estudos da professora de Harvard Amy Edmondson, uma das pioneiras a investigar o tema. Morando há 30 anos na Tailândia, ele prepara equipes de empresas ao redor do mundo e é autor do livro “The Untapped Team Advantage” e coautor de “Optimizing the Power of Action Learning”.

Cauwelier participa na terça-feira do 1º Summit Internacional de Segurança Psicológica, na Amcham, em São Paulo. Antes, concedeu entrevista ao Valor. Veja trechos:

Valor: Por que é preciso saber lidar melhor com os erros nas equipes e não buscar sempre o culpado?

Peter Cauwelier: A reação aos erros é sempre problemática. Todos os dias falamos de KPI e desempenho, mas só falamos sobre erros quando algo ruim acontece. Então, uma ferramenta é falar diariamente de erros bobos, tornar isso algo normal, e não dramático. É quase da natureza humana culpar. Existem erros que acontecem por causa do processo que estava instável. Precisamos gastar um tempo analisando os erros. Comece pelos pequenos, e de repente a gente deixa de culpar essa pessoa que errou.

 Valor: O sr. mora na Tailândia. Em seus estudos, percebeu relação entre a formação cultural e a forma como as equipes se comportam?

Cauwelier: Na minha tese, comparo três equipes: da Tailândia, França e EUA. O interessante é que sim, existem diferenças culturais, mas se você colocar oito pessoas em uma sala, elas não serão cópias carbono do padrão cultural. A cultura assume papel secundário em relação à forma como trabalham juntas. Então, quando me perguntam, eu digo que sim, a cultura faz parte da equação, assim como a experiência das pessoas, mas não é um elemento dominante.

Valor: A personalidade importa mais do que de onde a pessoa vem?

Cauwelier: Exatamente. Nem pessoas do mesmo país se comunicam da mesma maneira. Todos temos nossa personalidade. Não tenho mais 15 anos, então minha personalidade já foi moldada. Não espero que isso mude muito. E quando trabalho em organizações, prefiro focar em como trabalhamos, nos comunicamos, nos encontramos e tomamos decisões.

Valor: O feedback é um ponto importante na gestão de equipes, e alguns aceitam melhor que outros. Como promover um ambiente seguro para feedbacks mais sinceros?

Cauwelier: É um desafio. Muitas vezes, as pessoas o levam para o lado pessoal. Portanto, a primeira coisa a fazer é garantir que mantemos os fatos. É meio óbvio, mas não é tão fácil de implementar. Quando trabalho com equipe, incentivo as pessoas a darem feedbacks umas às outras. Digamos que você acabou uma reunião, se puder reservar cinco minutos no final, comece com algo positivo, percorra a sala e peça que todos digam o que apreciaram na contribuição de uma pessoa. É normal ouvir de outras pessoas o que elas apreciam de nós. O difícil não é o feedback positivo, mas é muito raro que as pessoas façam isso em equipe. Se você puder criar um hábito, quando se tratar de um feedback negativo ou de algo que precisa ser melhorado, todos saberemos que o erro foi daquela pessoa. Mas a ideia é como podemos, como equipe, nos certificarmos de que da próxima vez algo devastador não aconteça. Todo mundo sabe sobre a pessoa, incluindo ela mesma. Todos na equipe estiveram envolvidos, acho que isso cria uma energia mais positiva do que apenas ser chamado à sala do gestor.

Valor: Qual o papel da liderança na criação desse ambiente?

Cauwelier: O líder está ali para modelar comportamentos. Ele pode dizer: ‘você faz parte da minha equipe, eu não entendo isso, pode me ajudar?’, o que é incomum. Se um líder disser ‘já conversamos sobre esse problema há um tempo e vejo que fulano tem uma ideia diferente, vamos ouvi-lo porque talvez nos dê algumas ideias’, ele demonstra para todos que isso é possível. Podemos trabalhar juntos. Porque o verdadeiro valor de uma equipe é o que acontece entre os seus membros. É preciso encontrar maneiras de as pessoas trabalharem juntas e poderem pedir ajuda às outras.

Valor: E como criar esse ambiente de segurança psicológica em empresas onde se lida com grande pressão por resultados?

Cauwelier: Diga-me uma empresa onde não há pressão por resultados. Se isso é só o que importa, não se liga muito para todo esse desenvolvimento. Provavelmente, é um ambiente desperdiçado.

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