O que faz o presidente do conselho de administração – o ônus e o bônus

O que faz o presidente do conselho de administração – o ônus e o bônus

Diante da recente onda de falências e pedidos de recuperação judicial ocorrida no Brasil, boa parte delas concentrada em grandes empresas tidas como de boa governança, colunista revisita alguns conceitos clássicos sobre o papel do “chairman”

Por Guilherme Laager e Jose Luiz Alqueres – Jornal Valor Econômico

20/09/2023

A recente onda de falências e pedidos de recuperação judicial ocorrida no Brasil, boa parte delas concentrada em grandes empresas tidas como de boa governança, nos sugere revisitar alguns conceitos clássicos sobre o papel do “chairman” ou “presidente do conselho de administração”, como o termo é traduzido no Brasil. Importante observar que a terminologia em inglês vem de uma tradição que reflete o fato de a posição ser historicamente ocupada por homens, o que vem sendo felizmente transformado, ainda que aos poucos.

Imaginem uma sala de aula sem um professor. Assim seria um conselho sem seu comandante maior. Em uma empresa ele tem a maior responsabilidade: a de perceber que “o mapa não é o território”. Ele deve ter sabedoria e visão equilibrada do negócio.

Primeiramente, o presidente do conselho de administração deve ser uma pessoa de extrema maturidade e equilíbrio em seus julgamentos e assim percebido tanto por seus companheiros de conselho como por todos os stakeholders da empresa (acionistas, empregados e comunidade).

Além de possuir excelente capacidade de comunicação em situações normais e de crise, ele combina aptidões como o autoconhecimento com visão estratégica, conhecimento e tolerância a adversidades.

Em segundo lugar, o presidente deve ancorar em profunda racionalidade suas decisões, o que deve ser percebido por seus companheiros de trabalho.

O presidente do conselho deve reconhecer a importância dos momentos de “solidão e reflexão”, como disse Jan Carlzon — Foto: Unsplash

Em terceiro lugar, o presidente deve ser capaz de gerar uma empatia que deverá ir além da clareza na forma de se comunicar e na força da argumentação racional. Ele, autoridade maior da organização, deve trazer um “estoque de boa vontade”, uma espécie de “crédito” contra dificuldades que são inerentes a qualquer atividade empresarial. Elas sempre surgem para desafiar o corpo gestor. Embora muito sutil, a percepção desse “valor pessoal” do presidente acaba se traduzindo em um aumento do valor presente das ações da companhia em função da confiança pública quanto ao seu desempenho.

Uma vez no comando, o presidente deve ter a sua agenda para garantir um relacionamento equilibrado entre ele e stakeholders. Deve-se reconhecer a importância dos momentos de “solidão e reflexão”, como disse Jan Carlzon. É o “momento da verdade”, para avaliar se o rumo da estratégia proposta e aprovada pelos acionistas está atingindo os objetivos perseguidos, focando sempre na visão de longo prazo, na melhor alocação de recursos e na criação de valor a partir da diferenciação como vantagem competitiva. Sua boa relação com o CEO garante o elo necessário entre as grandes diretrizes e uma execução impecável. Assim segue o círculo virtuoso, o “flying wheel”, como definiu Jim Collins.

O presidente precisa saber usar “sinais” que devem ser claros e fáceis de compreensão, tendo por base seu caráter e a prática de valores sólidos, o que deverá espontaneamente inspirar aqueles que o cercam e se consubstanciar em boas práticas de gestão.

O Brasil é conhecido por ter grandes executivos e, cada vez mais, executivas na presidência de conselhos de administração. As peculiaridades de nossa economia ajudam a forjar gestores que sabem conviver bem com as incertezas, que minimizam os efeitos das inevitáveis adversidades, com “faro” e agilidade para prever as tendências e atentos às “regras do jogo”.

Não se deve esquecer, porém, que pesa sobre os ombros de quem exerce tal cargo uma enorme responsabilidade. O presidente do conselho responderá por quaisquer desvios de rumo, seja de natureza do negócio ou de “compliance”. Não raro surgem “tsunamis” onde o tombo é diretamente proporcional à altura da posição que exerce. As falhas mais clássicas estão no descaso quanto ao fato de que o sucesso do conselho é consequência do sucesso da gestão executiva e, portanto, na percepção de que o CEO ocupa uma posição crucial para o sucesso do empreendimento. É preciso possuir um conhecimento profundo do negócio e saber construir um debate positivo e saudável. Da mesma forma, os riscos naturais do setor de atuação da empresa devem ser completamente mapeados e é preciso contar com colaboradores inteiramente comprometidos com a tarefa de monitorar tais dados e municiar a gestão com informações de qualidade.

Atualmente, o mercado como um todo, especialmente nas economias abertas, procura adotar regulamentações que impõem um bom sistema de governança nas empresas. É bem verdade, entretanto, que ainda ocorrem escândalos de grandes proporções envolvendo executivos e gestores antes festejados no meio empresarial. Situações que infelizmente ocorrem penalizando, muitas vezes, investidores, consumidores e, principalmente, funcionários que perdem seus empregos. A incompetência ou omissão dos gestores não raro sai mais caro para aqueles do que para esses que efetivamente erraram. Em economias sadias, o “mercado”, por meio de seus instrumentos legais, procura corrigir e evitar que se repitam as práticas que prejudicam a tantas pessoas e criar um ambiente de negócio que promova efetivamente a segurança dos agentes envolvidos.

Constata-se assim que a posição de presidente do conselho, que assegura um bônus financeiro relevante a quem a ocupa, implica no ônus de satisfazer as inúmeras condições apontadas neste artigo.

Guilherme Laager é membro de conselhos de administração e consultor de empresas

Jose Luiz Alqueres é membro de conselhos de administração e consultor de empresas

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