O que o essencialismo ensina aos líderes

O que o essencialismo ensina aos líderes

Para o escritor Greg McKeown, é preciso ter conversas que não fiquem apenas na superfície

Por Fernanda Gonçalves — Jornal Valor Econômico

21/09/2023

Para ter sucesso e felicidade, é necessário focar nos aspectos essenciais da vida. Ou seja, não gastar tempo e energia com tarefas, compromissos e interações distratoras e eliminar tudo aquilo que não seja absolutamente necessário para alcançar os nossos objetivos.

Esse é o cerne do pensamento que o inglês Greg McKeown desenvolveu em seu livro “Essencialismo: a disciplinada busca por menos”, lançado em 2014, e que vendeu mais de um milhão de cópias pelo mundo.

Jornalista e especialista em liderança e estratégia, McKeown possui MBA pela Universidade Stanford. Ele também escreveu “Sem esforço: torne mais fácil o que é mais importante” (2021) e foi co-autor de “Multiplicadores: como os bons líderes valorizam você” (2010), ao lado de Liz Wiseman.

Enquanto se dedica à sua nova pesquisa, McKeown veio ao Brasil a convite do Mercado Livre para participar de um evento fechado para convidados. Antes, concedeu entrevista para o Valor. A seguir os principais trechos:

Valor: Sobre o que é a sua nova pesquisa?

Greg McKeown: Ela aborda o essencialismo interpessoal. Porque o essencialismo foi escrito principalmente para o indivíduo, para planejarmos nossas vidas em torno do que é considerado mais importante. Uma das coisas mais essenciais na vida são os relacionamentos, a habilidade de nos conectarmos com as pessoas e entendê-las, compreender o que é realmente importante para elas. Isso é como uma arte perdida. Tem a ver com os bloqueios da pandemia e com o fato de que podemos sempre olhar para os nossos telefones quando nos sentimos socialmente desconfortáveis. São muitas forças que dificultam profundamente nossa compreensão mútua. Não estar próximo e conectado com as pessoas é prejudicial para a nossa saúde e felicidade. E as pessoas tentam resolver os problemas errados. Elas tomam decisões obtusas e parecem desconectadas. Não porque não querem fazer as coisas certas, mas sim porque não são boas em se conectar com os outros.

Valor: E como isso se aplica à liderança?

McKeown: Eu acredito que isso seja o coração da liderança. A motivação e o comprometimento os levaram ao sucesso. Mas eles chegarão a um ponto em que vão estagnar em seu progresso. Se você já é bem-sucedido, mas deseja ser muito bem-sucedido, precisa prestar atenção em seus relacionamentos. E tudo se trata do quão rápido você pode entender corretamente o que está acontecendo a sua volta. Pense em um líder que é bombardeado por informações, opiniões e ruídos. Mas o que é essencial está escondido abaixo da superfície, especialmente nos relacionamentos interpessoais. Líderes têm muitas responsabilidades e interagem com pessoas que também estão ocupadas demais para realmente entendê-los. Então, todas as conversas ficam na superfície, onde é seguro, mas são completamente não essenciais.

Valor: Na sua opinião, qual seria o modelo ideal de liderança?

McKeown: Se você encontrar o líder ideal, uma das primeiras coisas que você vai notar é que ele está realmente presente. Não está pensando na próxima ou na última reunião, ou em sua agenda. Ele é capaz de ouvir e não vai fingir ter uma conversa. Ele entende o que está e o que não está sendo dito, e tenta tornar o espaço seguro para a outra pessoa ser sincera e se abrir. Portanto, esse líder coleta muito mais informações a cada conversa. A consequência é que a qualidade de suas decisões aumenta imediatamente.

Valor: E o líder não ideal?

McKeown: Este está constantemente distraído pelo seu telefone ou em sua própria mente. Líderes assim são escravos de sua maneira de pensar sobre o mundo e isso os torna muito parecidos com as pessoas mais perigosas de se ter no comando, porque não lidam com a realidade, e sim com a imagem que têm em suas próprias cabeças. E, por isso, acabam abordando as questões erradas, resolvendo os problemas errados e sendo ineficientes.

Valor: E como os líderes podem desenvolver essa rapidez para encontrar e identificar o problema certo para resolver?

McKeown: Basicamente, você tem que suspender seu próprio julgamento e entrar na cabeça da outra pessoa. Tem a ver com empatia. Fazer perguntas, conversar, ouvir, observar. Essa é a diferença entre um líder tóxico e um realmente fenomenal.

Valor: Você acredita que o essencialismo influenciou o surgimento de movimentos como a semana de quatro dias?

McKeown: Sim. Entrevistei um CEO que resolveu tornar toda a sua empresa essencialista. Ao mesmo tempo, ele ficou interessado na semana de trabalho de quatro dias e pensou: “se realmente quisermos ser essencialistas, devemos ser capazes de ter uma semana de trabalho de quatro dias e de alcançar 40 horas de resultados em 32 horas de trabalho, concentrando-nos nas coisas essenciais e eliminando as não essenciais”. O experimento deu certo e eles decidiram seguir com a semana de quatro dias de forma permanente. E o que as pessoas fizeram no dia extra foi realmente rico e incrível. Passaram tempo com suas famílias, adotaram hobbies, fizeram exercícios, viajaram, tornaram suas vidas mais significativas. E a empresa não perdeu nada. Nesse sentido, acho que alguns CEOs estão presos no passado, em uma mentalidade ultrapassada, que é: esforço máximo equivale a resultados máximos. Isso está errado. É um pensamento baseado na era industrial, onde as pessoas eram tratadas como coisas. Escrevi um artigo publicado pela “Harvard Business Review” chamado “Se você quiser uma equipe de alto desempenho, peça 85% de esforço”. As pessoas falam: precisamos de 110% de esforço e de 80 horas por semana. Mas isso não leva a resultados ideais, apenas a resultados médios, pessoas esgotadas e uma cultura tóxica. É um modelo mental simplista e incorreto.

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